Finalizando a nossa série de informativos sobre as Sentenças Arbitrais Públicas do CAM-CCBC – Volume 02, passamos a analisar os dois últimos casos publicados, que abordam obrigações pós-venda em operações societárias, com ênfase na violação de cláusulas de não concorrência e retenção de valores na venda de empresas.

No informativo anterior, referente ao Procedimento Arbitral nº 64/2013/SEC3, tratamos de uma controvérsia envolvendo um earn-out em que os vendedores alegaram que mudanças na gestão da empresa adquirida impediram o atingimento das metas estabelecidas no contrato. O Tribunal Arbitral reconheceu a interferência da parte adquirente e determinou o pagamento do earn-out aos vendedores, reforçando a importância da estabilidade administrativa no pós-fechamento de transações empresariais.

Agora, avançamos para casos que aprofundam a análise da concorrência desleal e da retenção indevida de valores em operações societárias. No Procedimento Arbitral nº 60/2014/SEC5, analisa-se disputa entre a Bonaire Climatécnica Ltda. e seus ex-controladores, que teriam violado a cláusula de não concorrência ao fundar uma nova empresa no mesmo setor. Já no Procedimento Arbitral nº 92/2016/SEC8, examina-se litígio decorrente da venda da Rápido Transpaulo Ltda., no qual os vendedores questionam a retenção indevida de valores da transação e o descumprimento de obrigações contratuais pelos compradores.

Os resumos a seguir detalham as principais controvérsias e decisões arbitrais em cada caso.

 

  • Procedimento Arbitral nº 60/2014/SEC5

Partes Envolvidas

  • Requerentes: Emte S.L.U.; Comsa Emte Infra-Estruturas, Instalações e Sistemas Ltda.; e Bonaire Climatécnica Ltda.
  • Requeridos: Indusclima Climatização Industrial Ltda.; Benjamim Martinelli Belinky; Mario Paulo de Castro Lobo; Sergio Aron Belinky.

Tribunal Arbitral

  • Árbitra Presidente: Adriana Noemi Pucci.
    Coárbitros: Marcos Paulo de Almeida Salles e Fernando de Oliveira Marques.

Resumo do Caso

O litígio decorreu da violação de cláusula de não concorrência firmada entre as partes em um Contrato de Compra e Venda de Quotas da Bonaire Climatécnica Ltda., celebrado em 30/06/2011. Os Requeridos, antigos controladores da empresa, comprometeram-se a não competir no mesmo segmento por um período determinado. No entanto, os Requerentes alegam que os Requeridos descumpriram essa cláusula ao fundar a Indusclima Climatização Industrial Ltda., operando no mesmo ramo e captando clientela da Bonaire.

Além disso, a disputa envolveu acusações de uso indevido de segredos empresariais e contratação de funcionários estratégicos da Bonaire pelos ex-controladores.

Decisão do Tribunal Arbitral

O Tribunal decidiu majoritariamente em favor dos Requerentes, reconhecendo a violação contratual e determinando as seguintes condenações aos Requeridos:

  • Reconhecimento da violação da cláusula de não concorrência, com a confirmação de que a Indusclima atuou no mesmo mercado durante o período proibido.
  • Indenização por danos materiais (R$ 3.539.721,00) e lucros cessantes (R$ 7.048.625,25).
  • Multas contratuais no valor de R$ 2.000.000,00.
  • Multa pelo descumprimento de liminar: R$ 11.200.000,00.
  • Extensão do período de não concorrência, adicionando tempo equivalente ao do descumprimento.

Os Requeridos também foram condenados a arcar com as custas arbitrais e honorários advocatícios sucumbenciais.

 

  • Procedimento Arbitral nº 92/2016/SEC8

Partes Envolvidas

  • Requerentes: Augusto Grando e Ivanilde Pistorello.
  • Requeridos: Supricel Participações Ltda. e Rápido Transpaulo Ltda.

Tribunal Arbitral

  • Árbitro Presidente: Rodrigo Octávio Broglia Mendes.
  • Coárbitros: Jorge Cesa Ferreira da Silva e Giovanni Ettore Nanni.

Resumo do Caso

A disputa decorreu da venda de quotas sociais da Rápido Transpaulo Ltda. pelos Requerentes à Supricel Participações Ltda., contrato que previa: (i) Retenção de parte do preço de aquisição para contingências; (ii) Cláusula de não concorrência; e (iii) Transferência de imóveis.

Os Requerentes alegam que os Requeridos retiveram indevidamente valores da transação, não transferiram os imóveis pactuados e descumpriram obrigações contratuais. Por outro lado, os Requeridos argumentam que a retenção foi legítima, pois os vendedores teriam prestado declarações inverídicas sobre a empresa.

Decisão do Tribunal Arbitral

O Tribunal decidiu parcialmente a favor dos Requerentes, determinando que:

  • Não houve provas suficientes de violação da cláusula de não concorrência, rejeitando a aplicação de multa.
  • Os Requeridos devem pagar a parcela retida do preço da aquisição, corrigida monetariamente.
  • Foi indeferido o pedido de revisão do preço de aquisição, pois as declarações prestadas pelos vendedores não foram consideradas inverídicas.
  • Os imóveis pactuados devem ser transferidos aos Requerentes.
  • Os Requeridos devem pagar indenização por danos morais e materiais.

Os Requeridos também foram condenados a arcar com as custas arbitrais e honorários advocatícios sucumbenciais.

 

  • Conclusão

Com esta última análise, concluímos nossa série sobre as Sentenças Arbitrais Públicas do CAM-CCBC – Volume 02, trazendo um panorama aprofundado das principais disputas arbitrais societárias no Brasil.

Ao longo das análises, exploramos temas críticos para a arbitragem empresarial, incluindo: (i) Retenção de valores e ajustes de preço em operações societárias; (ii) Cláusulas de não concorrência e sua aplicação prática; (iii) Revisão de balanços e interpretação de contratos à luz de normas contábeis; e (iv) Earn-out e impactos de mudanças na gestão pós-venda.

Esses casos refletem o papel fundamental da arbitragem na solução de litígios empresariais complexos, garantindo previsibilidade, especialização e segurança jurídica para investidores e empresas.

Seguiremos acompanhando tanto os desdobramentos do cenário arbitral quanto do cenário judicial, trazendo novas análises de decisões relevantes para o mercado. Fique atento às próximas publicações e continue acompanhando os temas mais relevantes do direito arbitral, societário e contencioso cível!

Por:

Gustavo Henrique Torres Rocha – Advogado

Caio Oliveira – Estagiário